Recomeço a minha participação (diversos problemas pessoais castradores adiaram-me) com uma colectânea difícil - talvez se tenha tornado ainda mais difícil a leitura pelo momento estranho em que vogava até há uma semana atrás e que o livro acompanhou, suavemente, não alimentando o meu mal estar, mas acrescendo imagens e imagens à minha percepção de decadência do ser humano.
Falo de Teatro Completo de Sarah Kane, edição disponível em português pela Campo de Letras dentro da colecção Campo do Teatro, n11, com tradução de Pedro Marques e que inclui as peças BLASTED, PHAEDRA'S LOVE, CLEANSED, CRAVE e 4:48 PSYCHOSIS, respectivamente Ruínas, Amor de Fedra, Purificados, Falta e 4:48 Psicose.
A obra desta dramaturga e encenadora inglesa é demasiado intensa para que ao lê-la não se pressinta algo de mau espreitando dentro de nós ou vindo do outro, é demasiado vísceral, truculenta, desumana, carnívora da nossa espécie! Deveria ser catalogado, caso existisse uma óbvia catalogação, de obra para adultos, não comestível por um qualquer, acessível apenas a não impressionáveis e a capazes de aperceber, na construção do texto de Kane e da desconstrução mental que se lhe segue bem de perto, da réstea de esperança na absolvição e redenção do homem e da mulher.
Centrei-me na peça 4:48 Psychosis que é um contínuo grito de Sarah posta em palco - é ela a personagem e dramaturga, é a ela que vemos, é aqui que ela se revê, nesses momentos íntimos, cheios, vazios, ocos, finais, até a essa última hora, as 4:48 da manhã.
Aconselharia este livro a quem não se importe de levar um soco fortíssimo no estômago e lhe consiga sobrevir! É de ler, no entanto e atentamente. A leitura é diferente porque se trata de uma peça de teatro e é a primeira que aqui se expõe / propõe. Eu por mim também foi a primeira que li sem ter visionado antes a peça - normalmente é um caminho que percorro, após ver a peça e caso esta me tenha marcado, compro o livro.
curiosidades :
1.As peças foram todas postas em cena em portugal pelos Artistas Unidos e encontra-se em produção pelo Estúdio Zero - As Boas Raparigas do Porto o 4:48 psicose.
2.Blasted foi composto ainda quando Kane frequentava o curso de artes em Bristol
3.Crave foi escrito sob o pesudónimo marie kelvedon
4.Kane também escreveu o guião para uma curta, Skin.
enlaces :
artistas unidos
as boas raparigas