21 de jul. de 2009

A LARANJA MECÂNICA (livro e filme)




Este é outro dos ilustres casos em que o filme abre o apetite ao livro e também das poucas vezes em que a transposição em filme presta um acertado tributo às páginas em que nasceu - outro é um livro que leio por agora chamado de Gomorra (opinião que terá divergências).

Escrevo sobre A Laranja Mecânica, livro e filme de seu nome original A Clockwork Orange - aquele de Anthony Burgess e este de Stanley Kubrick. Recém chegado de Bristol e refrescado de qualquer vaga ideia de contágio pela mais recente pandemia releio o livro e apetece-me rever o filme. E ao rever a terra, revejo-me também na violência que se encontra em diversas partes de Inglaterra e que serve de catalisador aos filmes de Ritchie e a este livro de Burgess.

A linhagem de criadores sci fi e distópicos ingleses é longa e profícua e do meu muito gosto pessoal, alinham-seVerne, Orwell, Tolkien, Swift, Burgess, Moore, Blake, Huxley, Shelley... Tal como Tolkien e como Orwell também Burgess criou o seu próprio vocabulário que aqui se mostra como o calão da nova população juvenil, os nadescentes que num futuro próximo - presente pop ainda por domesticar - perpretam a ultraviolência horroroíca do atolchocar e do mete-tira sobre os vecos e as debocheicas em pequenos bandos de drucos competidores. Bebem molco misturado com drogas e satisfazem-se nos dias de violência.

O livro é fantástico e de digestão fácil após as primeiras páginas e após entrar o vocabulário nadescente. Surge como uma antevisão e alarme contra o aumento da violência e o descontrolo e autoritarismo estatal - acaba por ser duplamente um manifesto contra o autoritarismo e um reflexo da indiferença da sociedade perante os seus. É de leitura imprescindível assim como o filme já é um clássico e portanto, necessário.

Este - o filme- é irrepreensível no tratamento da história como contada por Burgess e apresenta um Malcom McDowell extraordinário como Alex. Lembrei-me ainda agora que vi uma estátua realizada por Kubrick para o filme na exposição Porn Identity em Viena - toda a imagética e grafismo do filme, as propostas para indumentárias e decorações de bares e habitações está perfeita para o que a imaginação construiu a partir das páginas do livro.

Recomendo em absoluto. Ambos os objectos. Sigam apenas a ordem de leitura primeiro e depois o visionamento - parece-me que encaixa melhor e ficarão muito bem servidos, pois o filme é um complemento gráfico ao livro.

Relido por Sta Catarina - visto há uns anos por Coimbra.

Link :. http://www.imdb.com/title/tt0066921

Chave :.

nadescentes - adolescentes
horroroíca - fantástica
atolchocar - bater
mete-tira - cópula
vecos - tipos
debocheicas - miúdas
drucos - camaradas
molco - leite

3 comentários:

Ricardo Lopes Moura disse...

preferi, de longe, o filme. o livro pareceu-me escrito de uma forma demasiado adolescente, mal pensada.

um adrian mole delinquente?

rah pha disse...

Não li nada mais de Burgess para lhe colar ou reclamar um estilo - mas percebo o que comentas, o livro é talvez demasiado pouco trabalhado e a tempos frenético.

Mas vendo bem, não é ele uma descrição a partir do olhar de Alex? A partir daí, parece-me que encaixa lindamente.

Eu não consigo ter um preferido entre o livro e o filme - acho-os a ambos extraordinários.

Anônimo disse...

Não é de minha natureza admitir um filme ser melhor que as páginas de onde a estória nasceu, mas nesse caso foi espetacular. Quase um "Alice in wonderland" nas mãos de Tim Burtom. Escrito "nasco"? Talvez. Digamos que não era da perspectiva do autor uma influência tão grande pra sua obra, logo ficamos tão perplexos e "desapontados", admito que quando peguei o livro pra ler esperava um "encontro com Deus", mas fica a dica: Vale muito a pena ler!