30 de set. de 2009

A Viagem do Elefante



O livro A Viagem do Elefante fez-me companhia durante a viagem que, ainda, ando a fazer.
O livro, terminei-o há pouco; a viagem, termino-a em breve.
José Saramago mais uma vez me prendeu às páginas de um livro. Este relata a viagem do elefante Salomão e do conarca Subhro através da Europa do século 16, com partida em Lisboa e com destino a Viena de Áustria. O elefante é oferecido pelo rei D.João III ao arquiduque Maximiliano da Áustria. A viagem baseia-se em factos históricos, mas o enredo deixa-se levar pela ficção deliciosa a que José Saramago nos habituou.

20 de set. de 2009

RAPA NUI



Vi este filme porque se desenrola na e sobre o meu mais desejado destino de viagem, a ilha de Páscoa, no Oceano Pacífico e pertencente ao Chile. Eu tenho um fascínio especial por ilhas e ainda mais por ilhas que contêm uma civilização original que caminhou confinada rumo a uma avançada cultura. Desde a temporada nas Berlengas e a estadia continuada nas ilhas da Ria Formosa que o desejo veio crescendo e já não me chega apenas a acostagem a Almourol, ao Pessegueiro e ao Bugio. Eu quero Cuba, eu quero Mount Saint Michel na Normandia ou o Saint Michael Mount na Cornualha, eu quero Ilha de Moçambique, eu quero o Corvo, eu quero Gorée em Dakar e eu quero absolutamente a Ilha de Páscoa.

Graficamente chamada de Umbigo do Mundo (Rapa Nui) pelo claro isolamento e depois chamada de Páscoa pelos pouco originais e inexoráveis exploradores europeus, esta ilha que foi povoada por incansáveis povos polinésios criou uma alta cultura alicerçada em fortes crenças religiosas que levaram à construção de milhentas estátuas de divindades em santuários de Moai e ao estabelecimento do culto do Homem-Pássaro. A par com esta construção desenfreada foi desenvolvida também um sistema de escrita único e que permanece por decifrar na sua totalidade. Ao que parece o povo estabelecido na ilha foi conquistado e submetido por outro povo entretanto chegado e a guerra civil que estalou entre os dois povos acabou por ser a chave para a sua decadência - finalizado entretanto com o contacto com os insaciáveis europeus.

O filme encontra-nos no meio da competição entre os dois povos - os Orelhas Grandes e os Orelhas Pequenas. A corrida da personagem central em construir um Moai em tempo recorde e de conquistar o ovo e assim adquirir o título de Homem-Pássaro servem de veículo e de reconstituição da sociedade ultrareligiosa e socialmente estratificada de Rapa Nui. O que obtemos é um filme documento simpático que é sobretudo delicioso para fanáticos desta ilha como eu - o romance da personagem principal com uma rapariga que pertence ao outro grupo, serve como tempero talvez um pouco forçado mas ainda assim credível, para um documento histórico interessante.

Visto ali.
Enlace | http://www.imdb.com/title/tt0110944

O PRÍNCIPE



Sempre me surpreendeu o axioma utilizado em português para nos referirmos a algo que achamos calculista e maldoso - o adjectivo maquiavélico. Aparte se parecer foneticamente com bélico a palavra deixou-me curioso em demasia até conseguir deitar a mão a um dos seus livros mais conhecidos e que ganhou notoriamente estatuto de clássico e que é este livro que vos trago aqui - O Príncipe.

Para melhor ler este livro há que conhecer também a história de Niccolo Maquiavel, que intercala períodos de brilhantismo sob o ducado de Florença com alturas de caída em desgraça. O livro é um panfleto que surgiu numa época conturbada para o escriba e que lhe serviu como unguento e homenagem destinado a cair novamente nas boas graças do todo poderoso governante do Grão Ducado da Toscana, Lourenço de Médici.

Oferecido por Maquiavel ao estadista como seu único possível presente em todos os possíveis presentes - o escritor reforça a ideia de que a sua única graça é a escrita e que nada mais poderia ofertar - O Príncipe é uma colecção de observações e um guia inteligente para a compreensão da governação dos povos e do papel e comportamento do governante para que melhor governe ou para também que mais e melhor usufrua e mantenha os seus estados conquistados.

É interessante reparar que a edição que tenho em casa foi comentada por Napoleão que usou o livro como cartilha antes e ainda durante a sua conquista da Europa. É delicioso estudar o seu comportamento, as suas afectações e a sua arrogância que finalmente o perderam com a Guerra Peninsular e o General Inverno. Ao ler o livro de Maquiavel lembrei-me doutro livro do género - A Arte da Guerra de Sun Tzu que também já comentei por aqui.

E ao lê-lo percebi perfeita e finalmente o significado de maquiavélico. É de calculismo e de diplomacia que é feito o livro, é sobre a perfeição e idealização do estadista que discorre o livro, é sobre o governo ideal que nos fala Maquiavel e é sobre a necessidade da inteligente aliança ou declaração de guerra em determinado momento providencial que leva a que o príncipe se mantenha como incontestado e eterno governante sobre os seus estados. A palavra que surgiu reflecte esse modo calculista e diplomata de estudar o problema e lhe aplicar a melhor solução - não necessariamente a última ou a que leve a avançar, mas sim aquela necessária em que o recuo e a passividade surgem como virtudes de espera e de sobranceria.

É de ler - é de estudar. É um documento histórico necessário e de perfeita compreensão das mentalidades e intrigas da Alta Idade Média italiana.

Relido por LX em saltitando.

DISTRICT 9



District 9 é um filme genial dirigido por Neill Blomkamp e produzido pelo agora omnipotente Peter Jackson, que veicula e patrocina uma extraordinária primeira obra do primeiro. Fiquei surpreendido com o filme quando me mostraram o trailer - ainda mais quando percorri o site e então, quando finalmente o vi, foi a apoteose!

O filme é verdadeiramente incrível e um dos melhores que vi desde sempre do género. E que género é esse? Aqui está a questão, pois se temos sempre tendência quase inconsciente a compartimentar tudo, colando rótulos e etiquetas a tudo o que consumimos, também se torna cada vez mais usual que lidemos com objectos como estes: híbridos, sem um rótulo consensual, com uma mensagem clara transmitida por não tão claros mecanismos. O filme é sci-fi naturalmente, mas abraça tanto a questão política e social que se assume um novo género que me atrevo a chamar de Sci-fi Realism em evocação ao Neo-Realismo italiano que tinha como temática as classes operárias e à margem da sociedade.

A mensagem clara é a da incompreensão e segregação de um povo perante outro. A referência política e real é o regime opressivo e discriminatório do Apartheid e o povo que oprime é o humano e o oprimido um grupo de aliens que foi confinado a um distrito de subúrbio de Joanesburgo que se transforma num gueto militarizado onde os aliens - apelidados de Praws - se vão multiplicando até atingirem quase 2 milhões. Esta é a imagem mais forte e sobretudo sarcástica e cínica dado que é sobre um novo grupo de marginalizados que não os povos negros africanos que recai a própria teoria segregacionista que tanto os afectou. Aqui os extraterrestes são os oprimidos há já duas décadas tanto por negros como por brancos relevando que o ser humano é sempre devedor de incompreensões perante as diferenças.

Além do local filmado e do objecto do filme serem completamente originais, outra qualidade dos ETs é diferente da grande maioria de filmes sobre visitantes do espaço: eles são pacíficos e pretendem apenas voltar a casa - a nave mãe paira sobre a cidade mas é-lhes impossibilitado o regresso a ela por não possuirem o módulo de ligação.

O ET phone home em terras sul-africanas é o mote para um filme que surpreende também em efeitos especiais e nas referências fílmicas e históricas utilizadas - Cloverfield pelo suporte utilizado da câmara digital e pelo subterfúgio em que se desenrola a história, no primeiro era uma gravação que era posteriormente encontrada e que seria entremeada com uma gravação de férias e de um encontro/desencontro de um par amoroso.

Aqui é o recurso a terceiras testemunhas, seja pelas reportagens à distância dos canais de televisão, seja pelos documentários de trabalho de campo da MNU (Multi-National United - organismo militarizado responsável pelo controlo e policiamento do gueto onde os aliens estão localizados). O Apartheid está sempre presente seja na memória colectiva seja nos cartazes que segregam os aliens dos humanos. E a transferência necessária que a MNU tenta empreender (mudança em massa dos aliens do distrito 9 para um novíssimo mas não menos precário distrito 10 - mais afastado da cidade e por crescente insistência da população desta) é similar aos guetos e às transladações nazis.

Sharlto Copley está perfeito no seu papel do trapalhão agente da MNU, Wilkus e na verdade, toda a equipa de actores está tremendamente credível. Vejam o filme porque valerá bem a pena, está fantástico como se quer.

Visto nas Vasco Tardio Sessions ao Saldanha
Link | http://www.d-9.com